Orgulhosamente criativa e independente, Ana Seixas é toda cor, luz, plantas, gatos, quadrados e bolas, pastas e tintas. ‘Daquelas que gosta de meter a mão na massa’, no atelier, separa o limpo do sujo e divide o seu tempo entre trabalho comissionado e projectos pessoais, a ilustradora e artista plástica é amiga e cúmplice da CRU, desde Junho de 2014, data em que chegou ao cowork.
Nasceu em Viseu, em 1984. Licenciou-se em Design pela Universidade de Aveiro e fez uma pós-graduação em Design Editorial na Bau, em Barcelona, cidade onde, mais tarde, concluiu o curso de ilustração infantil e juvenil na Eina. Actualmente, vive e trabalha no Porto.
Após ter trabalhado como Designer durante 5 anos para diferentes empresas de publicidade e revistas, decidiu dedicar-se inteiramente à ilustração, na qual recorrentemente se debruça sobre a interpretação do dia-a-dia, as relações com os animais e a natureza, paisagens reais e imaginárias.
A serigrafia também faz parte do seu percurso, tendo sido a responsável pela implementação de um estúdio de serigrafia na CRU de 2015 a 2020 — a Lola PrintScreen.
Mais recentemente, a cerâmica tornou-se a menina dos seus olhos, a qual exibe, graciosamente, na sua loja/atelier — na Rua de Oliveira Monteiro 483, no Porto — e na sua loja online, bem como em outros pontos de venda, como a CRU.

Sabemos que tens a tua marca própria e que também és freelancer em ilustração. Conta-nos como foi que chegaste a esta forma independente de trabalhar.
Soube que queria ser freelancer desde a primeira semana em que comecei a trabalhar numa agência de comunicação, em Viseu. Isso de passar 8 horas do meu dia à espera de chegar a casa e ter tempo para dedicar às minhas coisas não era para mim. Tinha de ser o meu projecto a tempo inteiro, precisava de espaço e tempo para criar.
Fui saltando de part-time em part-time (em design ou noutra coisa qualquer) sempre tentando conciliar a estabilidade com a ansiedade de criar o meu projecto, ainda indefinido naquela altura.
Até que me cruzei com a ilustração e decidi especializar-me nessa área.
Comecei a procurar clientes e, entre os projectos de ilustração que foram surgindo e os desenhos que fazia para colocar à venda online, pouco a pouco o meu projecto foi tomando forma até chegar ao que é hoje.
Actualmente, o meu trabalho tem essas duas vertentes bem mais definidas: os projectos de ilustração para clientes — trabalho sobre um briefing definido por eles, desenvolvendo ilustrações que serão depois usadas em suportes gráficos variados (livros, cartazes, folhetos, campanhas…) — e as minhas lojas online e física, para as quais, crio vários tipos de produtos, ilustrações para decorar, peças de cerâmica, artigos têxteis, pins, postais, actividades para crianças, etc.
O que fazes para ‘desconectar’?
Às vezes esqueço-me do importante que é parar, mesmo quando o trabalho me dá prazer. Por isso tenho que me organizar mentalmente e obrigar-me a desligar do trabalho, sem sentimento de culpa. Tento encontrar outra actividade que me motive igualmente e que implique algum processo de aprendizagem: fazer yoga, nadar, caminhar, dançar ou patinar.
Casa, escritório, coworking, oficina?… Onde passas as tuas horas de criatividade e produtividade?
Um bocadinho de tudo! Gosto de estar em casa ou na mesa do café a pensar, ler e esboçar, planear, organizar o calendário e a fazer gestões de papeladas, a um ritmo mais pausado.
Quando estou no atelier, é para desenvolver e criar o trabalho propriamente dito. Tenho uma zona onde posso desenhar ao computador ou no iPad e outra zona “suja” de oficina, onde faço as minhas peças de cerâmica e preparo encomendas.
Vou alternando consoante o que tenho que fazer e também como me sinto. Se o corpo me pedir para ficar em casa, tenho essa possibilidade e facilidade de me adaptar. É daquilo que mais gosto no trabalho por conta própria, danço ao meu ritmo.
Quem são as tuas referências na área da ilustração? Que super-poderes têm el@s?
Lisa Congdon and Louise Lockart são, talvez, as referências que tenho mais à mão. Ambas trabalham como freelancers e o seu trabalho de ilustração sai do papel e viaja para uma variedade infinita de suportes. E as cores, sempre as cores.
Por outro lado, os criativos que me rodeiam acabam por me inspirar, inevitavelmente. Terão sempre maneiras diferentes de pensar e de enfrentar os projectos: essa ideia de que há uma infinidade de soluções para o mesmo problema e que todos podemos aprender uns com os outros interessa-me muito.
Que formas encontras de activar a tua marca e de fazer chegar o teu trabalho aos olhos (e às casas/prateleiras) dos teus clientes?
Nem sei bem, acho que este é o meu grande desafio, comunicar com os clientes.
Sempre dediquei muito tempo a criar o meu site, enviar emails aos clientes com quem queria trabalhar, mas quando as redes sociais tomaram conta disto tudo foi aí que depositei a minha energia, sem saber muito bem como.
Acabo por dedicar muito tempo ao Instagram e, ultimamente, uso as Newsletters para comunicar com os clientes da loja.
Como é para ti ser uma criativa independente, actualmente?
Criativa independente é uma definição que me empodera, obrigada! Ao princípio sentia que o freelancer, especialmente designer, era o que não conseguia trabalho numa agência, então, não tinha outra opção senão trabalhar por conta própria. Não sei se era a minha impostora a sussurrar-me ao ouvido ou se essa ideia existia realmente.
No entanto, quando cheguei ao Porto e à CRU, essa ideia foi-se esbatendo e senti que, dentro desta comunidade de freelancers, entendemos-nos e ajudamo-nos uns aos outros a crescer. Para mim, ser criativa independente não é estar fechada numa sala, isolada do mundo a fazer o meu trabalho, mas exactamente o contrário. É poder partilhar com outros criativos, criar em conjunto, saltar as fronteiras da ilustração e do design e experimentar outras possibilidades.
Por outro lado, senti, e ainda sinto, muitos entraves a nível fiscal, legal, social, sei lá… parece que deixaram a gaveta da desordem burocrática para os freelancers.

A que tribos pertences?
Sou da tribo que faz, os Makers, assim nos chamam. Daqueles que gostam de meter a mão na massa, mergulhar em materiais e ferramentas.
Sou acumuladora de coisas que um dia me poderão servir e tenho o superpoder de ter 10 tesouras e não saber onde está nenhuma.
O que te faria mais feliz ou realizada profissionalmente?
Sou muito feliz e realizada profissionalmente! Gosto do que faço e posso viver do meu trabalho, não há nada melhor que isto.
Talvez fosse mais feliz se aprendesse a lidar de forma mais saudável com as inseguranças e medos que por vezes me travam, mas isso já é outro processo.
Que outra profissão terias se não fosses ilustradora?
Olha, nunca pensei nisso! Jardineira, talvez. Não me importava de fazer pet sitting ou algo parecido.
Pastora? Teria que ser alguma profissão relacionada com cuidar de animais e/ou plantas.
Covid 19, 20, 21… que dores ou triunfos foste somando ao longo deste período?
Fechou tudo na semana em que ia inaugurar a loja física, foi uma bofetada fortíssima. Tive que lidar com esta desilusão e adaptar-me. A loja online funcionou bem e permitiu-me manter o projecto vivo.
Este tempo permitiu-me também embarcar num novo desafio e juntei-me ao Patreon, onde partilho o meu processo de trabalho e crio conteúdo apenas para quem me segue nessa plataforma. É uma maneira diferente de criar, mais livre e sem algoritmos viciados.
Por outro lado, os projectos de ilustração para clientes diminuíram e, à força, aprendi a trabalhar a outro ritmo, menos intenso e mais ponderado, o que até acabou por ser bom!
O CRU Spotlight é um rubrica de pequenas entrevistas a pessoas da comunidade CRU, com foco em aspectos da sua vida profissional como independentes no sector das Indústrias Criativas.
Texto: Tânia Santos Edição: Rossana Fonseca Fotografias: Cortesia Ana Seixas